18/06/2021 - 08h21

Vale a pena financiar um imóvel com a Selic a 4,25%?

Valor Investe
 
Taxa básica de juros mais alta deve encarecer o valor do crédito imobiliário e tornar as parcelas mais salgadas, além de reduzir o poder de compra
 
Após um ciclo de cortes que levou os juros do crédito imobiliário às mínimas históricas, a taxa básica de juros, Selic, subiu pela terceira vez em 2021, indo de 2% a 4,25% ao ano. Até o momento, a média dos juros de financiamento de imóveis continua abaixo de 7% ao ano entre os cinco maiores bancos, informa o comparador de crédito Melhortaxa.
 
No entanto, com a Selic seguindo o caminho inverso e partindo para uma temporada de altas que poderá chegar a 6,25% até o fim do ano, os bancos tendem aumentar as taxas. Por consequência, o financiamento se torna mais caro. Para quem quer comprar imóvel a prazo, a janela de oportunidade, como dizem os especialistas, está quase se fechando.
 
Quando há uma alta nas taxas de financiamento, ainda que pequena, o custo do crédito de longo prazo se torna bem maior, as parcelas mais salgadas e acaba caindo também o poder de compra do consumidor.
 
Mas, de acordo com o presidente da plataforma de crédito imobiliário Credihome, Bruno Gama, os bancos ainda possuem boas margens para trabalhar com taxas historicamente baixas como vemos agora. Por isso, mesmo que essa seja a terceira alta, ainda há espaço para manter o ambiente competitivo.
 
"Essa alta da Selic, que agora está em 4,25%, ainda não deve gerar um repasse para as taxas de crédito imobiliário, uma vez que os bancos ainda têm margens (spreads) boas e suficientemente saudáveis. Além disso, a competição nesse mercado está alta entre os principais bancos de varejo, já que o crédito imobiliário é utilizado como ferramenta de fidelização da base de clientes", afirma.
 
O spread, que é a diferença entre o valor de captação de recursos para emprestar o dinheiro e o que o banco recebe em juros, ainda é significativo. Como a maior parte dos recursos do crédito imobiliário vem da poupança, o custo de captação em juros equivale a mais ou menos 2,98% ao ano, contra cerca de 7% ao ano recebido em juros do crédito imobiliário, sem falar nas tarifas cobradas no financiamento.
 
Mas o fato é que, com uma demanda ainda em alta por financiamento, os bancos podem não aceitar reduzir suas margens por um longo tempo, principalmente se a Selic continuar subindo.
 
"O patamar que temos visto no crédito imobiliário é do piso histórico do Brasil. No curto e médio prazo, talvez tenha algum ajuste de taxa para cima. Mas, sem dúvida ainda estamos na janela de oportunidade pra adquirir um novo imóvel ou partir para um 'upgrade'. Ainda que não pegue a menor de todas as taxas ainda será um patamar bom, principalmente quando se vislumbra uma subida de Selic", afirma a presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), Cristiane Portella.
 
De acordo com Portella, o aumento iminente não será suficiente para desacelerar o bom momento do crédito imobiliário. Somente nos primeiros quatro meses do ano, houve alta de 122% no volume de dinheiro emprestado para compra e construção de imóvel com recursos provenientes da poupança.
 
De janeiro a abril de 2021, já foram concedidos quase R$ 60 bilhões em crédito, quase a metade dos R$ 124 bilhões financiados em todo o ano de 2020.
 
"São vários fatores que contribuem para esse crescimento na concessão de crédito, que estimamos que pode chegar a 34% até o fim do ano. Entre eles você tem o déficit habitacional, juros mais baixos e a poupança das famílias que aumentou na pandemia e permite uma entrada ou a compra de um imóvel mais caro", afirma.
 
Outro argumento para o "compre assim que possível" é de que o preço dos imóveis segue um tanto quanto abaixo da linha de mercado, se comparado ao pico do "boom imobiliário" visto em 2014. Mesmo que venham aumentando nos últimos meses, em recuperação após anos de desvalorização, essas altas costumam ficar abaixo da inflação.
 
"Independente deste ajuste e o caminho da Selic para o fim do ano, quem estiver buscando comprar não deve ficar esperando. Se de um lado os juros dos bancos podem subir, de outro, a pressão inflacionária nos custos da construção e a demanda também afetam os preços dos imóveis. Assim, quem estiver procurando deveria acelerar o negócio", avalia Rafael Sasso, especialista em mercado imobiliário e professor da Finted Tech School.
 
Sasso sugere ainda que aqueles que já possuem um financiamento imobiliário mais antigo devem correr para tentar negociar as taxas antes que elas comecem a aumentar. E caso não haja sucesso, procurem o direito de portabilidade de crédito, que permite que você leve a dívida para um outro banco que ofereça condições mais vantajosas de pagamento.
 
O presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) Luiz França defende que, apesar de a Selic estar em alta, o setor imobiliário ainda deve ser visto como atrativo. Não apenas para financiamento, mas também para investir, uma vez que as aplicações tradicionais de renda fixa continuem com rentabilidade historicamente baixa.
 
"O ambiente de negócios continua propício, com grande atratividade para investimentos em imóveis em comparação com as aplicações financeiras tradicionais", pontua.
 
Atenção para as linhas atreladas à poupança
 
A demanda pelo crédito imobiliário, a briga dos bancos por essa clientela, fez surgir novas linhas de financiamento. Além das tradicionais linhas corrigidas pela Taxa Referencial (hoje em zero), ganharam força o financiamento com outros indexadores como a inflação IPCA e o rendimento da poupança.
 
As novas linhas costumam oferecer juros fixos muito menores, mas também implicam em mais risco com a variação dos juros básicos e da inflação. Por isso, é importante que o consumidor fique atento ao cenário na hora escolher o seu financiamento.
 
O co-fundador do Minha Casa Financiada Vinícius Motta lembra que com a alta da Selic, cresce também a rentabilidade da poupança saindo de 2,45% para 2,98% ao ano. Isso vai deixar as parcelas dessas linhas mais caras. "As taxas estavam muito chamativas, com Selic a 2%. Agora sobem para taxas maiores, sendo melhor para o cliente voltar a usar as taxas atreladas à TR", diz.
 
Mesmo que a janela esteja parecendo se fechar, vale ter paciência e avaliar bem na hora de assinar uma dívida de muitas décadas, como costuma ser o caso do financiamento imobiliário. Isso porque, como Motta sugere, o mercado imobiliário pode sofrer uma retração, agora que a Selic torna as aplicações de renda fixa um pouco melhores.
 
"Tudo depende do objetivo de que produto a pessoa quer. Se estivermos falando de um produto de construção financiada, sempre será melhor financiar do que alugar ou investir. Já para imóveis prontos e usados, existem outros fatores que podem fazer com que o cliente ache produtos melhores no mercado para aportar seu capital, sendo que o sonho da casa própria é o que permeia o mercado brasileiro", afirma.
 
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