24/11/2020 - 08h42

Novos conceitos no mercado imobiliário

O Globo / Lucas Obino*
 
Fundos aportaram no segmento residencial
 
Mesmo numa crise que pode resultar na maior recessão da história, vendas e lançamentos do mercado imobiliário seguem em alta. Mais que a Covid, a taxa de juros é o que determina o ritmo da construção civil. Paralelamente a esta recuperação, ocorre, até com maior intensidade, um movimento pouco notado, mas que já impacta o setor, alterando a origem do capital que o viabiliza e que passa a modelar suas entregas e seu uso. Algo aguardado para daqui a anos tomou porte inimaginável em meses.
 
Há tempos, os fundos imobiliários viam a queda do segmento comercial, majoritário em suas carteiras, e observavam o residencial, dominado por seus pares nos Estados Unidos e Europa. Veio a Covid e fez multidões de profissionais trabalharem de suas casas, algo que para muitos não mais mudará, intensificando a vacância de incontáveis escritórios.
 
Em meses, os fundos aportaram no segmento residencial, onde, com outros investidores profissionais, já modelam as entregas da indústria, principalmente as voltadas a um tipo de consumo que valoriza a experiência em detrimento da posse, algo que não era satisfeito pelo modelo tradicional de locação residencial.
 
Isso se dá desde a concepção dos projetos  — como o anunciado pela incorporadora americana Greystar Real Estate Partners, que, com a Cyrela e o fundo de pensão canadense CPP Investments, investirá R$ 1 bilhão na construção de dez edifícios residenciais voltados à locação em áreas nobres de São Paulo  — até a adequação do que já existe. Isso motivou a Loft — startup que se notabilizou comprando imóveis, remodelando-os (o chamado retrofit) e revendendo-os — a ingressar no segmento de aluguel residencial com a aquisição de outra startup, a Uotel.
 
A financeirização do segmento residencial traz novos conceitos, métricas e tecnologias para corrigir disparidades que aumentam a vacância de imóveis ao inflacionarem lançamentos e distorcerem preços dos usados — fazendo, por exemplo, com que o metro quadrado de um imóvel novo valha quatro vezes mais que o de um antigo em um mesmo quarteirão de Porto Alegre, sem nada que justifique tamanha discrepância.
 
Valores começam a ser equalizados para que, com a ocupação de mais unidades, esses investimentos sejam remunerados. Isso se dá também na recuperação do potencial econômico de imóveis.
 
Grandes construtoras passam a atuar no retrofit, incipiente até há pouco. Mais voltada ao alto padrão, a atividade segue para o segmento popular para converter edifícios desocupados em região centrais de metrópoles em residências para público de baixa renda. Esse tipo de ocupação de perímetros urbanos é ambicionado pelo Ministério das Cidades e estratégico para a indústria, por conta do elevado giro do segmento popular.
 
Fundos chegam a todas as pontas do segmento residencial, mesmo a modalidades alternativas de investimento. Surgido há cinco anos no país como forma de gerar crédito, via reunião de pequenos aportes, para empreendimentos, o crowdfunding imobiliário, antes opção exclusiva para pessoas físicas, atrai agora investidores profissionais.
 
Sempre haverá o comprador tradicional de imóveis, mas em menor escala. Enquanto cresce o número de pessoas físicas que só conheceram uma economia estável — onde a segurança proporcionada pela casa própria perde o sentido diante da falta de liquidez e consequente deságio de um bem que gera custos fixos —, surge um novo tipo de proprietário que, para obter suas receitas, atua para que haja oferta adequada à demanda de cada momento.

*Lucas Obino é arquiteto e sócio-fundador da fintech de investimento imobiliário Urbe.me
 
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