22/10/2019 - 00h10

Mesmo parado, retorno do aluguel ganha atratividade ante renda fixa

Valor Econômico
 
Retorno até então modesto da locação de imóveis vem se tornando maior que o de aplicações que seguem o CDI e títulos atrelado à inflação
 
O retorno obtido com aluguel de imóveis passou um bom tempo perdendo para a rentabilidade registrada em aplicações de renda fixa mais básicas e conservadoras. No entanto, a queda da taxa básica de juros (Selic) para a mínima histórica de 5,5% ao ano impôs uma mudança nesse cenário. Mesmo sem ter se movido, a taxa média de 0,38% ao mês da locação residencial, com correção anual pela inflação (normalmente pelo IGP-M), passou a superar não somente o rendimento do CDI como também os juros periódicos pagos semestralmente por títulos do tipo Tesouro IPCA+ de médio prazo.
 
Em termos anuais, estamos falando de um retorno na faixa de 4,6% no aluguel, com correção anual do valor pela inflação, ante um juro real de 2,8% ao ano no Tesouro IPCA+ 2024.
 
Essa vantagem em termos de retorno, contudo, precisa ser ponderada por análises de risco de crédito e liquidez, além do valor da aplicação inicial, que é muito maior no caso de imóveis.
 
"A gente acredita que é um bom momento. O cenário atual é bem peculiar e está muito a favor do mercado imobiliário. Vivemos um momento de juros muito baixos. Rendimentos tradicionais perderam rentabilidade. Temos observado que há uma tendência clara de uma procura maior de imóveis residenciais pra alugar do que para comprar. Nosso dados de buscas eram maiores pra venda que aluguel há cinco anos. Hoje se inverteu. É uma mudança do comportamento da sociedade, uma tendência não só no Brasil, mas em todo lugar", afirma Sérgio Castelani, economista-chefe do DataZAP, do grupo Zap.
 
A comparação com o Tesouro IPCA+ (que consta do infográfico abaixo) considera os juros médios assegurados ao investidor no momento da compra do título público, que é o retorno esperado pelo investidor que faz a aplicação com o objetivo de obter renda periódica. Para efeito de cálculo, portanto, desconsideramos as variações do preço do título em função da flutuação da curva de juros futuros (o que acaba alterando o retorno desses papéis no curto prazo. Entenda melhor aqui).
 
A comparação foi feita também considerando a rentabilidade real, já descontada a inflação. Isso porque o valor do aluguel costuma ser ajustado anualmente pelo IGP-M. Embora com regras um pouco diferentes, o título do Tesouro Direto IPCA também remunera o investidor com juro real, na medida que o valor do título é corrigido pela inflação do período, e os juros são calculados sobre o preço atualizado. Veja a seguir:

 
Já o Tesouro Selic tem remuneração nominal levemente superior à do aluguel e do cupom de juros do Tesouro IPCA, mas fica atrás das duas opções quando é descontada a inflação. Para se ter ideia da mudança de cenário, em 2011, o Tesouro Selic rendia cerca de 0,9% (bruto) ao mês, enquanto o retorno do aluguel ficava perto de 0,5% ao mês.
 
 
De acordo com o índice FipeZap, o preço dos imóveis está em leve queda, enquanto o valor nominal do aluguel passa por pequena valorização. Se esse movimento continuar, a tendência é um retorno nominal até um pouquinho melhor para o aluguel.
 
Quais os riscos?
 
Dito isso, vale destacar que rentabilidade não é tudo. E contar com a renda de aluguel não é tão fácil assim. Você tem de administrar o imóvel, corre risco de vacância (não ter inquilino) e de crédito (levar um belo de um calote). E possuir um imóvel também implica gastos com consertos, reformas, taxas de obras em condomínio, impostos etc.
 
Sem falar que o valor inicial do investimento para comprar um imóvel para aluguel não é acessível para qualquer tamanho de bolso, enquanto os títulos públicos que começam com aplicações mínimas de R$ 35 e são os mais seguros em termos de risco crédito — você só não recebe se o Estado brasileiro quebrar.
 
Fundos imobiliários
 
Para quem quer aproveitar o momento para investir no mercado imobiliário existe ainda a opção dos fundos de investimento imobiliários (FIIs), que batem não só as aplicações de renda fixa, mas o próprio retorno do aluguel.
 
De acordo com o especialista em fundos imobiliários da Eleven Financial, Raul Grego, os fundos que têm como lastro o investimento em edifícios comerciais (sem contar com aqueles de galpões, shoppings ou CRIs), tiveram taxa de retorno média de 0,51% em setembro, já descontada a taxa de administração que gira em torno de 1% do valor aplicado ao ano. A rentabilidade acaba sendo maior que o índice médio de 0,44% ao mês do retorno de aluguel comercial, divulgados pelo FipeZap.
 
Esse tipo de FII costuma ter diversas lajes e salas comerciais que geram aluguel. O valor recebido pelos contratos de locação é então distribuído proporcionalmente entre os cotistas (investidores dos fundos). A regulação prevê que os dividendos (repasse de parte dos aluguéis) sejam pagos a cada seis meses, mas em geral os gestores realizam depósitos mensais com esse montante.
 
O retorno dos fundos também costumam incorporar a correção dos contratos de aluguel pela inflação. E tem mais uma vantagem: os dividendos são isentos de imposto de renda (enquanto o rendimento da pessoa física que recebe aluguel diretamente está sujeito à tributação).
 
Grego observa, no entanto, que a queda da Selic também influenciou indiretamente no retorno médio dos fundos imobiliários. A rentabilidade média acabou caindo nos últimos 12 meses. Isso ocorreu porque o valor das cotas (que é o pedacinho do fundo em que você investe) subiu.
 
Os FIIs se tornaram mais procurados por ter rentabilidade superior a aplicações mais tradicionais de renda fixa, sobretudo em cenário de juros muito baixos. “Se você comprar uma cota de FII hoje para investir em dividendos, mesmo agora que a cota já se valorizou, o retorno ainda é melhor que o aluguel. Além de o aluguel no fundo imobiliário ser isento, o investidor fica mais líquido. Se ele compra um imóvel, vai investir muito mais. Se ele precisar vender, precisa vender o imóvel inteiro. No fundo, ele pode vender só uma parte do que precisa resgatar”, argumenta Grego.
 
No aluguel tradicional o ganho mensal deve ser discriminado no imposto de renda do proprietário e pode chegar a 27,5% do que for recebido. Os títulos do Tesouro e fundos de renda fixa também seguem uma tabela regressiva de imposto que varia de 22,5% a 15% a depender do tempo de aplicação. Nos fundos imobiliários, os dividendos são isentos. Quando você se desfaz da cota, no entanto, tem de pagar 20% sobre o valor de ganho ante o preço de compra (se houver ganho).
 
Assim como o aluguel, os fundos imobiliários estão sujeitos a risco de vacância e crédito. Mas, por terem mais de um ativo (mais de um prédio ou sala comercial, por exemplo), acabam diluindo esses riscos. Um imóvel pode estar vago, mas os outros que pertencem ao fundo continuam gerando alguma renda. Eles também possuem um valor inicial de investimento mais baixo que a compra de imóvel.
 
Por mais que a queda da Selic tenha prejudicado um pouco o retorno dos FIIs, ela acabou por movimentar o mercado desses fundos. Isso contribuiu para deixar os títulos mais líquidos (mais fáceis de vender e comprar).
 
Dessa forma, você tem duas maneiras de ser remunerado com esses fundos. A primeira é receber os dividendos, como se fosse o aluguel. A segunda é mais incerta: esperar que a cota se valorize para vendê-la e receber mais dinheiro nela do que pagou - o que pode ou não ocorrer.
 
Se a Selic continuar a cair, como preveem especialistas, o cenário em que aluguel e fundos imobiliários rendem mais que CDI e Tesouro IPCA deverá se manter. Porém, caso a taxa básica de juros volte a subir, existe a possibilidade de a situação se inverter: os FIIs poderiam perder liquidez e se desvalorizar e a rentabilidade do aluguel poderia voltar a ficar abaixo das aplicações de renda fixa.
 
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