16/08/2017 - 01h38

Casa própria: um sonho com os pés no chão

Migalhas / Carlos Matheus Gutierrez*
 
Segundo os dados da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias, em 2016, o mercado imobiliário registrou a primeira alta na venda de imóveis depois de 13 meses consecutivos de queda.
 
O desenvolvimento do setor imobiliário e dos projetos governamentais de aquisição de imóvel próprio são exemplos que refletem a conquista de um bem que, por anos, permaneceu como status de sonho para a maioria da população brasileira. Embora o ano de 2017 venha se destacando pela movimentação política e crise econômica, a aquisição de bens de consumo duráveis recebeu uma considerável injeção de ânimo, obrigando a reinvenção da busca pelo cliente.
 
Se por um lado há organização para captar novos clientes ou convencer, os já fidelizados, a aumentar o seu patrimônio, do outro, há a busca do melhor custo benefício, pois a oferta é consideravelmente grande, mas limitada pelo capital disponível.
 
Segundo os dados da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), "em 2016, o mercado imobiliário registrou a primeira alta na venda de imóveis depois de 13 meses consecutivos de queda. Ultrapassada a fase de compra e venda, nascem inúmeras preocupações, desde a convicção de que o capital disponível será suficiente para quitar o contrato firmado, até a certificação de que o imóvel será entregue nas condições pactuadas. Via de regra, nenhuma das partes perfectibiliza a relação de compra e venda com intenção de desfazimento do negócio, mas nem sempre as circunstâncias são favoráveis".
 
Pelo comprador, surge o fantasma do financiamento. Com a perspectiva de retomada de crescimento do mercado imobiliário, a inciativa privada tem fomentado o financiamento independente de crédito imobiliário brasileiro. Em razão das instituições financeiras estarem mais áridas nas ofertas, o mercado imobiliário está demandando alternativas para manter aceso o comércio imobiliário.
 
Por parte do vendedor, jogar-se no mercado imobiliário, independente da condição, pode reservar muitos percalços, com comprometimento da saúde financeira da empresa. Mas ainda que haja o adimplemento substancial dos compradores, se o imóvel objeto da compra e venda não for entregue no prazo convencionado, o inadimplemento passa a ser do vendedor, gerando obrigações de compensação e ressarcimento àqueles que estão aguardando a respectiva entrega.
 
Dentre os impedimentos que incidem sobre o cumprimento do prazo na entrega do imóvel no tempo constante no contrato, estão:
 
a) as questões climáticas — na região sul, este é um dos principais fatores de atraso na entrega da obra. As constantes chuvas e umidade são elementos naturais que não podem ser desconsiderados quando a empresa estabelece o cronograma de entrega das unidades. Não se trata de previsão futura, mas de conscientização de que o local onde se está construindo possui características climáticas que poderão influenciar no cumprimento do prazo de entrega contratado.
 
b) a desmobilização da obra — a ausência de mão de obra qualificada encabeça uma das preocupações dos empreendedores no setor imobiliário.
 
c) a fiscalização/embargo de obra — uma vez desmobilizada a obra por um embargo, por exemplo, o prazo de restabelecimento da construção raramente consegue remontar a estrutura existente anteriormente.
 
Constatado o atraso na entrega da obra, ao comprador cabe buscar pelo cumprimento do prazo contratado ou o recebimento de valores decorrentes do respectivo atraso, fazendo com que o judiciário aplique multa contratual (caso existente) ou encontre uma solução alternativa de compensação ao comprador pelo atraso na entrega da obra.
 
Quando o imóvel é entregue, alguns cuidados devem ser levados em conta para evitar preocupações e gasto de energia desnecessário. A entrega das chaves do imóvel deve ser precedida de vistoria. Deve o comprador dedicar alguns instantes para efetivamente vistoriar o imóvel. É comum que a euforia da aquisição do almejado bem relativize o cuidado que o comprador deve ter em receber o imóvel. A unidade entregue e as áreas comuns devem ser vistoriadas. Eventual discordância com as características do bem, o comprador deve comunicar a empresa vendedora sobre as irregularidades apuradas, concedendo prazo para a resolução da situação.
 
Por fim, um assunto que tem se mostrado em grande efervescência é à devolução, ou não, da taxa de corretagem. Há quase um ano, a 2ª seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou recursos repetitivos que tratam de temas relacionados à comissão de corretagem e da taxa de Serviço de Assessoria Técnica Imobiliária (SATI) pagas pelo consumidor. Na época, o colegiado decidiu, de forma unânime, pela validade da cláusula que transfere ao consumidor o pagamento da comissão de corretagem.
 
Contudo, entendeu abusivo impor ao comprador o pagamento da taxa SATI. O reconhecimento e validação do repasse ao consumidor da referida taxa (corretagem) tem esbarrado na ciência prévia do adquirente sobre os valores e finalidade cobrados. O adquirente tem de saber os valores pagos relativamente à corretagem e essa ciência deve ser prévia. Nessa mesma linha, o maior impasse está nas aquisições oriundas dos programas governamentais Minha Casa Minha Vida (MCMV), cujas ações estão suspensas – Resp – 1.601.149.
 
Com essas breves considerações, é importante salientar que o contexto imobiliário do país dá indicativos de reinvenção, considerando a necessidade de comercialização de unidades ainda represadas pela queda das vendas. A sugestão é que após a efetiva compra do imóvel, ambas as partes se acautelem na busca e na garantia dos seus direitos sobre o bem para que o elemento surpresa não culminem no desfazimento do sonho da obtenção da casa própria.
 
*Carlos Matheus Gutierrez é advogado especialista em contratos, responsabilidade civil e Direito Imobiliário, do escritório Sperotto Advogados Associados.
 
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